Deputado Helder durante pronunciamento em audiência pública na CCJ

CÂMARA DOS DEPUTADOS – 02 DE JULHO DE 2019

Discurso para a audiência conjunta das Comissões de Constituição, Justiça e Cidadania, Direitos Humanos e Minorias e Trabalho, Administração e Serviço Público com o ministro Sérgio Moro.

Sr. Presidente,
Sr. Ministro,
Senhores parlamentares,
Povo Brasileiro que nos acompanha pela TV Câmara.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos estabelecem a garantia de julgamento por tribunal competente e independente, a presunção de inocência, o princípio da legalidade, o devido processo legal como direitos humanos inerentes à dignidade de todos os indivíduos. A Constituição da República Federativa do Brasil também prevê essas normas como direitos fundamentais.

Dito isto, senhor ministro, vou narrar aqui alguns fatos: em março de 2016 o senhor determinou a condução coercitiva do ex-presidente Lula sem que ele tivesse sido previamente chamado a depor. No mesmo mês o senhor divulgou para a imprensa gravações telefônicas travadas entre a então Presidenta Dilma Rousseff e Lula.

Ao nosso ver, neste caso, foi usurpada a competência do Supremo Tribunal Federal, que é o responsável por matérias que envolvam Chefes de Estado, e houve também, desrespeito às normas brasileiras que estabelecem o sigilo do conteúdo das interceptações telefônicas. Houve, ainda, violação dos direitos humanos à inviolabilidade da privacidade, à intimidade e à honra.

Em vídeo sobre este assunto, divulgado nas redes digitais, ainda em 2017, o senhor já aparecia ao lado de Procuradores da República responsáveis pela acusação na Lava Jato, demonstrando uma postura de que todos juntos defendiam a mesma causa. Nas audiências de inquirição das 73 testemunhas, os acusadores fizeram cerca de 900 perguntas, enquanto o senhor realizou cerca de 2.100 perguntas, em claro protagonismo do juiz no papel acusatório.

As matérias divulgadas pelo jornal The Intercept Brasil confirmaram este modus operandi. Ministro, o sistema inquisitório é medieval. Pensemos na Santa Inquisição: o acusador era o mesmo que o juiz. Esse sistema permite um quadro mental paranoico; a criação de bruxas a serem posteriormente condenadas. Foi exatamente o que vimos no Brasil recentemente.

O sistema acusatório, que os procuradores tanto mencionam nas mensagens reveladas, é o sistema que veio com as luzes trazidas pelo Iluminismo, no século 18. O essencial é justamente a separação entre acusador e julgador. Aquele que busca culpados não pode ser o mesmo que julga. E é esse princípio basilar da civilização moderna que foi violado!

O grau de comprometimento do processo, denunciado pelas reportagens do The Intercept Brasil, levou a Comissão de Direitos Humanos e Minorias a aprovar requerimentos para ouvir os atores envolvidos no caso: o jornalista Glenn Greenwald, responsável pela publicação das matérias, o sr. ministro Sérgio Moro e o promotor de justiça Deltan Dallagnol, ambos participantes diretos de possíveis articulações ilegais presentes em conversas divulgadas pelas reportagens.

A nossa comissão de Direitos Humanos e Minorias já ouviu o jornalista em uma audiência, na semana passada, com mais de 6 horas de duração, oportunidade em que o convidado defendeu a veracidade dos diálogos, a responsabilidade com a checagem das informações e o cruzamento do conteúdo dos diálogos e os fatos e atos públicos da força tarefa em busca de robustecer a narrativa apresentada nas matérias.

Defender a lisura do processo é defender a democracia e a Justiça. Não podemos combater corrupção com mais corrupção, afirmou o jornalista Glenn Greenwald na audiência da Comissão.

Para encerrar, gostaria de apresentar aqui algumas perguntas ao senhor ministro.

1) Quando a divulgação das mensagens site de notícias The Intercept Brasil, começou, o senhor não negou a autoria das mesmas (nem o MPF negou quando divulgou a primeira nota oficial), mas, em seguida, o senhor adotou o discurso de que não poderia dizer que aqueles diálogos de fato aconteceram. Por que o senhor mudou de ideia?

2) O senhor disse que foi um descuido ter formalizado à Procuradoria a sugestão sobre uma testemunha no caso Lula. Ao admitir que foi um descuido, o senhor não teria admitido serem verdadeiras aquelas mensagens?

3) As mensagens divulgadas indicam uma colaboração entre o senhor e o Ministério Público, durante todo o processo do tríplex do Guarujá. O senhor considera ter mantido uma distância equivalente entre as partes, como determina o Código de Ética da Magistratura?

4) Por que o senhor disse: em Fux nós confiamos? Inclusive não falou na primeira pessoa do singular (eu confio), mas na primeira pessoa do plural (nós confiamos). Ou seja: juiz e promotor confiam, num claro sinal de sintonia fina entre o acusador e o julgador.

5) Ao tratar da divulgação das interceptações ilegais entre Lula e Dilma, o senhor afirmou em entrevista que o mais importante era o conteúdo. Por que mudou de ideia? Já que agora diz que o mais significativo é a forma com que as conversas foram capturadas e não o conteúdo?

6) O projeto inicial das dez medidas anticorrupção previa a possibilidade de uso de provas ilegais desde que obtidas de boa-fé. O senhor mantém essa opinião?

7) O senhor também gravou áudio pedindo desculpas ao MBL. Confesso que isso me causou enorme estranhamento. Ora, se o senhor coloca dúvida sobre a veracidade das informações divulgadas pelo The Intercept Brasil, por que o pedido de desculpas?

8) Por fim, reiteradas vezes o senhor cita os Estados Unidos como exemplo a ser seguido. O jornalista Glenn Greenwald, norte-americano radicado no Brasil há quinze anos, disse que lá é impensável um juiz fazer o que o senhor fez aqui à frente da Lava Jato. Disse que lá, por muito menos do que o senhor fez, juízes e promotores perderam seus cargos. Pergunto: o que o senhor tem a dizer sobre isso?

Ministro Sérgio Moro, a sociedade brasileira e a comunidade internacional esperam respostas.

Muito obrigado!