Colegiado afirma que ações do presidente expõem a população ao contágio pelo Coronavírus e vão contra normas mundiais de isolamento e proteção.
Nesta segunda-feira (6), a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM) presidida pelo deputado Helder Salomão (PT-ES) enviou um relatório para o diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus e para o presidente da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) Joel Hernández García. O documento relata a situação do Brasil diante da pandemia e enumera atitudes do presidente da República, Jair Messias Bolsonaro que, por exemplo, incentivam as pessoas a descumprirem medidas de distanciamento, ironizam o risco massivo à vida e desinformam os cidadãos sobre a gravidade da emergência de saúde que o Brasil e o mundo vivem.
O documento da CDHM informa as autoridades internacionais que desde o dia 20 de março o país vive, oficialmente, estado de calamidade pública. Até a manhã desta segunda, foram revistados em todo Brasil 11.516 casos da doença e 506 mortes. Porém, um estudo do Centre for the Mathematical Modelling of Infectious Diseases, estima que apenas 11% dos casos são notificados no país.
O próprio ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, afirma que em abril o sistema de saúde brasileiro entrará em colapso. O ministro também aponta falta de profissionais de saúde capacitados para manejo de equipamentos de ventilação mecânica, fisioterapia respiratória e cuidados avançados de enfermagem e os leitos de UTI e de internação não estão estruturados e nem em número suficiente para a fase mais aguda da epidemia.Com adoção de medidas de supressão precoce, estima-se que o Brasil terá 44 mil mortos por Covid. Sem adoção de medidas de contenção, o Brasil pode ter mais de 1,1 milhão de mortes.
O documento enumera fatos que mostram o comportamento, considerado irresponsável, adotado pelo presidente da República. Desde discursos incentivando aglomerações de pessoas, carreatas de apoiadores pelo fim da quarentena, passeios por áreas comerciais e participação em manifestações de suposto apoio ao fim do isolamento social.
Ele já se referiu ao Covid-19 como “pequena crise”, “fantasia”, “gripezinha » e « resfriadinho ». Além disso, 22 pessoas que acompanharam Bolsonaro em uma viagem aos Estados Unidos, entre 7 e 10 de março, ficaram contaminadas pelo vírus. Bolsonaro afirma ter feito os testes para detectar a doença, mas nunca mostrou o resultado dos exames. Mesmo assim, continuou a promover reuniões presenciais com servidores, ministros, empresários e políticos.
A CDHM exemplifica para a OMS e CIDH a falta de responsabilidade de Jair Bolsonaro com a população brasileira, através do pronunciamento dele em rede nacional, no dia 17 de março. «Esse vírus trouxe uma certa histeria e alguns governadores, no meu entender, eu posso até estar errado, estão tomando medidas que vão prejudicar e muito a nossa economia”. Grande parte dos meios de comunicação (…) espalharam exatamente a sensação de pavor, tendo como carro chefe o anúncio de um grande número de vítimas na Itália, um país com grande número de idosos e com um clima totalmente diferente do nosso. (…) Devemos, sim, voltar à normalidade.Algumas poucas autoridades estaduais e municipais devem abandonar o conceito de terra arrasada, como proibição de transporte, fechamento de comércio e confinamento em massa.O que se passa no mundo tem mostrado que o grupo de risco é o das pessoas acima dos 60 anos. Então, por que fechar escolas? Raros são os casos fatais de pessoas sãs, com menos de 40 anos de idade. 90% de nós não teremos qualquer manifestação caso se contamine. (…)
No meu caso particular, pelo meu histórico de atleta, caso fosse contaminado pelo vírus, não precisaria me preocupar, nada sentiria ou seria, quando muito, acometido de uma gripezinha ou resfriadinho (…) », disse o presidente à Nação.
Bolsonaro demostrou não compreender que o isolamento vertical é inviável para um vírus letal e que tem parte expressiva da população pertencente a grupos de risco. No Brasil, 30 milhões de brasileiros são idosos, 10% tem asma, 13 milhões têm diabetes e 25% da população é hipertensa. O país
tem ainda a falta de testes amplos para a doença e a maior parte da população vivem e, moradias de pequenas com famílias numerosas. Bolsonaro ainda considera que a morte de idosos é aceitável.
Nos dias seguintes, relatam os ofícios da CDHM, o presidente da República publicou decreto liberando cultos religiosos, e que foi suspenso pela justiça. Também foi proibida pelo judiciário uma campanha do governo federal a favor do isolamento vertical e a volta da atividade econômica.
Mais declarações mostraram a falta de preparo de Bolsonaro para enfrentar a pandemia. Ao comentar o fato de os Estados Unidos ultrapassarem o número de casos da China « acho que não vai chegar a esse ponto, até porque o brasileiro tem de ser estudado, não pega nada. Vê o cara pulando em esgoto, sai, mergulha e não acontece nada.” E ainda “todos nós iremos morrer um dia”.
A conduta de Jair Messias Bolsonaro a respeito do Covid-19 já tem cinco representações criminais no Supremo Tribunal Federal. Elas apontam seis crimes cometidos pelo Chefe de Estado: perigo para a vida ou saúde de outrem, infração de medida sanitária preventiva, prevaricação e incitação ao crime.
Os parlamentares que assinam o documento discorrem também sobre a série de fake News publicadas pelo presidente e que resultaram até em pedido de desculpas e retirada no ar pela administração de redes sociais.
Medidas de apoio econômico aos mais pobres foram tomadas pelo Congresso Nacional como a lei que estabeleceu o pagamento de uma renda emergencial de R$ 600,00 para pessoas de baixa renda, limitado a R$ 1.200,00 por família. Porém , o governo ainda não começou o pagamento do benefício.
O relatório da CDHM ressalta que “ o Presidente da República Federativa do Brasil flerta com o risco de um genocídio e menospreza a possibilidade de óbito de idosos. Nenhum cidadão, muito menos um mandatário, pode usar a liberdade de expressão para desinformação e para colocar em situação de risco a saúde e a vida de mais de 200 milhões de pessoas”
Mesmo diante de todo quadro de preocupação e aumento no número de vítimas , Jair Messias Bolsonaro afirma que pode, a partir de hoje (6) determinar a liberação do comércio caso governadores e prefeitos não relaxem as medidas para contenção do novo coronavírus. Como demonstram experiências de outros países e os dados científicos, se essa diretriz governamental for colocada em prática, pode custar centenas de milhares de vidas.
A CDHM pede aos organismos internacionais quais os parâmetros que municiais devem ser obedecidos e quais estão sendo desrespeitados no Brasil. A Comissão ainda solicita providências, dentro das respectivas áreas, para auxiliar o país nesse momento de emergência.
Assinam o relatório os deputados Helder Salomão (PT/ES), presidente da CDHM e os vice-presidentes do colegiado Padre João (PT/MG). Túlio Gadêlha (PDT/PE) e Camilo Capiberibe (PSB/MA).
Pedro Calvi / CDHM