Meira Lima, que também coordena a Comissão da Mulher da Anadep, enumera um caso que é exemplo da população atendida pela defensoria pública: “Uma mulher que já estava em regime aberto, depois de cumprir parte da pena, porém descumpriu as regras para voltar ao presídio porque estava em situação de rua e grávida. No presídio teria abrigo, comida e atendimento médico”. Ela apresenta ainda outros dados, nos casos de abuso sexual de crianças e adolescentes: 87% dos agressores são homens e 83% das vítimas são meninas.
Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) aponta que, no Brasil, existem mais de 100 mil pessoas em situação de rua. A mulher nesta situação vive em condições de extrema vulnerabilidade, com vínculos familiares interrompidos e, às vezes, são usuárias de drogas. Também correm o risco de abuso físico e emocional, maus-tratos, exploração financeira, intimidação sexual e exposição ao crime.
Racismo e violência obstétrica
De acordo com o IBGE, a taxa de mortalidade entre mães negras é maior. São 275 mortes por 100 mil nascidos vivos, enquanto entre mulheres brancas a taxa é de 43 por 100 mil nascidos. No parto, as mulheres pretas são atendidas, na maioria, em estabelecimentos públicos (58,9%), contra 46,9% de mulheres brancas.
“A morte de uma mulher não é só uma morte que acontece pelo sentimento de posse, mas também por ser negra, pobre ou lésbica, ficamos mais vulneráveis. A criminalização do aborto mata mulheres pobres e negras. Estamos sendo exterminadas há 500 anos”, diz Soraia Mendes, jurista e especialista em direitos humanos. Ela ainda exemplifica tipos de femicídios. “O reprodutivo, por causa da violência obstétrica e abortamentos mal sucedidos, e o político, como no caso de Marielle Franco”. A jurista informa que hoje no Congresso tramitam cerca de 140 proposições legislativas sobre violência contra a mulher.
A violência obstétrica ocorre quando um profissional de saúde toma alguma atitude, seja verbal, física ou psicológica e afeta a mulher durante a gestação, parto, no período de puerpério ou ainda em situação de abortamento.
Luciana Rocha é coordenadora do Núcleo Judiciário da Mulher do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Ela sugere a ampliação da Lei Maria da Penha: “Não queremos que se limite apenas a um processo condenatório, a Lei Maria da Penha exige muito mais, como ações integradas e uma política judiciária de enfrentamento com a implantação de varas especializadas principalmente no interior do país”. No próximo dia 7 de agosto, a Lei Maria da Penha completa 13 anos.
Mulheres encarceradas
Conforme dados do Departamento Penitenciário Nacional, a população carcerária feminina do Brasil é uma das maiores do mundo. São mais de 42 mil mulheres presas, sendo que, deste total, 62% são negras, 74% mães e 45% são presas provisórias, ou seja, aguardam julgamento. A Anadep considera que, apesar de algumas medidas como o habeas corpus coletivo, que concedeu a prisão domiciliar para mulheres presas provisoriamente que estejam grávidas, que tenham dado à luz recentemente ou que sejam mães e tenham sob responsabilidade crianças de até 12 anos de idade, ainda inexistem políticas públicas voltadas às mulheres presas no país.
A campanha
Pedro Paulo Coelho, presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos destaca que a campanha da instituição surgiu para informar as mulheres, principalmente as mais pobres, sobre o que a defensoria pública pode fazer para ajudá-las: “O machismo institucional é muito grave, não pode ser normal piada machista, por exemplo, isso faz parte do ciclo de violência que a sociedade brasileira vive.Só em 2018, foram mais de 90 mil denúncias referentes a agressão física, psicológica, sexual, moral e cárcere privado”. Ele acrescenta que muitas mulheres vítimas de violência não sabem que têm direito aos serviços da defensoria pública. “A Lei Maria da Penha determina que a defensoria ofereça assistência judicial e extrajudicial em situações de violência doméstica e familiar. Ajuízamos ações de alimentos, divórcio, reconhecimento e dissolução de união estável, e requerimento de medida protetiva de urgência, por exemplo”.
“Precisamos entender que a violência contra a mulher está disseminada e que acontece das mais diversas formas, não apenas pela violência física, mas também pela negativa de direitos, pela desigualdade no tratamento, pela diferenciação salarial, pelo desrespeito a seus direitos sexuais e reprodutivos”, pondera o presidente da CDHM, Helder Salomão (PT/ES). Ele ressalta que, com a Lei Maria da Penha, o código penal passou a reconhecer a agressão contra a mulher no ambiente familiar como um crime e pune o responsável com prisão. “Esta mudança reorientou toda a política protetiva à mulher, com a articulação de uma rede de enfrentamento”.
Também participaram da audiência Marjorie Chaves, Coordenadora de Políticas de Promoção e Proteção da Igualdade Racial da Secretaria de Justiça do Distrito Federal, e Aline Yamamoto, Gerente de Projeto da Onu Mulheres.
Pedro Calvi / CDHM
Foto: Fernando Bola
Fonte: site da Câmara dos Deputados – CDHM